Você sabia que empregado ou servidor público tem direito à redução da jornada de trabalho para cuidar de filho portador do Transtorno do Espectro Autista?
Dificuldades de interação ou comunicação social, comportamentos repetitivos e restritos e hipersensibilidade a estímulos sensoriais. Essas são as principais características de quem convive com o autismo, também conhecido como Transtorno do Espectro Autista (TEA).
No Brasil, estima-se que existam 2 milhões de pessoas portadoras do TEA, correspondendo a cerca de 1% de toda a população. Ainda, segundo o Ministério da Saúde, os primeiros sinais do TEA podem ser percebidos nos primeiros meses de vida, com o diagnóstico estabelecido por volta dos 2 a 3 anos de idade.
Cada indivíduo dentro do espectro apresenta um conjunto de sintomas com características e intensidades bem variadas. Dessa forma, tanto o diagnóstico, quanto o tratamento, devem ser personalizados de acordo com as particularidades de cada caso. Nesse sentido, o tratamento multidisciplinar realizado por profissionais especializados, é fundamental para o desenvolvimento e qualidade de vida do autista, inclusive, é de grande importância o acompanhamento dos pais durante todo o processo.
Dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (TEA)
A Lei 12.764/12 instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, e determina em seu art. 1, § 2º, que a pessoa com transtorno do espectro autista é considerada pessoa com deficiência, para todos os efeitos legais.
Além disso, referida legislação expressa que a pessoa com TEA tem direito a uma vida digna, com direito ao acesso a ações e serviços de saúde, com vistas à atenção integral às suas necessidades de saúde.
Sabemos que o tratamento multidisciplinar de autismo é uma abordagem terapêutica que envolve diferentes profissionais de saúde, como psicólogos, neuropediatras, fonoaudiólogos, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais e psiquiatras, que trabalham juntos para ajudar a melhorar a qualidade de vida das pessoas com autismo.
Essa abordagem terapêutica é especialmente importante para crianças e jovens com autismo, que podem ter dificuldades em se comunicar, interagir socialmente e realizar atividades cotidianas devido aos seus sintomas. O tratamento multidisciplinar pode ajudá-los a desenvolver habilidades sociais e de comunicação, melhorar seu desempenho acadêmico e aumentar sua independência.
Ocorre que, com os pais trabalhando o dia inteiro, o tratamento da criança muitas vezes é comprometido, pois geralmente as consultas aos médicos e especialistas ocorrem em horário comercial.
Então é aí que surge a possibilidade da redução de jornada de trabalho, sem prejuízo da remuneração ou compensação de horas, para empregados e servidores públicos, pais ou responsáveis de pessoa com deficiência.
Da redução da jornada de trabalho
Acerca das garantias concedidas aos empregados pais de crianças com necessidades especiais, a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) não estabelece regramento específico, por isso o caso não se aplica a empregados da iniciativa privada.
Há regulamentação específica, no entanto, na Lei 8.112/90, que regula o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, ou seja, servidores públicos federais.
Todavia, em julgamento realizado em dezembro de 2022, o Supremo Tribunal Federal estendeu esses direitos aos servidores públicos dos municípios e estados quando do julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1237867. Importante destacar que essa decisão deve ser seguida por todos os tribunais do Brasil.
Eu fiz concurso público, mas tenho regime celetista. Tenho direito também?
A resposta é SIM!
Empregado Público e Servidor Público: qual é a diferença?
Apesar de ambos serem cargos obtidos essencialmente por concurso público, o empregado público e servidor público são dois regimes de contratação bem distintos.
Quando você ingressa no serviço público e tem sua carreira regida pelo estatuto, ou seja, uma lei específica estabelece os seus direitos, dizemos que você possui regime estatutário e, portanto, é um servidor público.
Por outro lado, caso você ingresse no serviço público e é contratado pelo regime celetista, ou seja, possui relação contratual de acordo com os benefícios da CLT (Consolidação de Leis Trabalhistas), você é um empregado público.
Sou celetista, então tenho direito à redução de jornada de trabalho?
Como dito acima, quem é empregado da iniciativa privada – contrato de trabalho celetista -, não tem direito.
Este benefício somente é válido para quem está no serviço público, seja pelo regime estatutário ou celetista.
Por que celetista do serviço público tem direito e da iniciativa privada não?
De forma geral, a CLT regulamenta as relações entre empregado e empregador, trazendo alguns dos direitos e deveres que devem ser seguidos pelas partes.
Como dito anteriormente, já existe uma lei vigente que aborda o direito à redução de jornada de trabalho para àqueles que estão no serviço público federal (Lei 8.112/90), e a decisão do Supremo Tribunal Federal a estendeu ao serviço público estadual e municipal.
Independente de se estar no serviço público sob o regime estatutário (servidor público) ou celetista (empregado público), ambos têm um ponto em comum, que é o SERVIÇO PÚBLICO.
Todavia, quanto à iniciativa privada, ainda não há uma lei abordando o assunto, e a Justiça não pode impor uma obrigação para ela sem que haja previsão legal.
O que preciso providenciar para conseguir a redução de jornada?
Para conseguir a redução de jornada na Justiça é preciso reunir os seguintes documentos:
1. O médico (não precisa ser especialista) precisa fazer um relatório médico detalhado com toda a situação do paciente, dentre elas, temos:
– Nome completo do paciente;
– Descrição da deficiência com CID;
– Descrição detalhada do diagnóstico e da evolução da deficiência;
– Descrição detalhada dos tratamentos multidisciplinares que necessita, como, por exemplo, fisioterapia, fonoaudiologia, etc., descrevendo a quantidade de vezes por semana e o tempo de cada sessão. É importante dizer o porquê dessa terapia e qual benefício ela irá trazer ao paciente, além de destacar a importância do acompanhamento pelo genitor e/ou responsável.
2. Relatório dos profissionais que acompanham o paciente (fonoaudiólogo, terapeuta, etc), descrevendo a quantidade de vezes por semana e o tempo de cada sessão. É importante trazer um breve relato da situação em que o paciente se encontra, e qual benefício ela irá trazer ao paciente. Além disso, o profissional deve destacar a importância do acompanhamento pelo genitor e/ou responsável.
Com o relatório detalhado nas mãos faça o requerimento administrativo no setor responsável e aguarde a negativa que, muito provavelmente virá. Em seguida, em contato com a nossa equipe para ingressar com ação judicial.
Atenção: O requerimento administrativo e sua negativa são obrigatórios para servidores públicos (regime estatutário). Via de regra, para empregados públicos (regime celetista) não se exige requerimento.
PERGUNTAS FREQUENTES:
Na sequência, respondemos as perguntas mais frequentes a respeito da redução de jornada para empregado e/ou servidor público para cuidar de filho (ou dependente) com deficiência.
A redução da jornada de trabalho é possível apenas para empregados/servidores públicos, genitores ou responsáveis de pessoa com TEA?
Não. Tem direito a redução da jornada de trabalho todo empregado/servidor público, genitores ou responsáveis de pessoa com deficiência, seja ela visual, motora, mental, auditiva, dentre outras.
Eu trabalho em uma empresa pública / empresa de economia mista, tenho esse direito?
Sim, você tem direito. Para se trabalhar em uma empresa pública/de economia mista, você precisa passar por um concurso público, se tornando então um empregado público (regime celetista). Nesses casos, você passa a ter direito a essa redução de jornada.
Esse é o caso de empregados da Caixa Econômica Federal, CeasaMinas, Codemge, MGS – Minas Gerais Administração e Serviços, CEMIG, Copasa, dentre outras.
Terei minha jornada reduzida em quanto tempo?
Pela lei você pode ter a redução em até 50% da sua jornada de trabalho, mas no âmbito do processo, quem fará a análise nesse aspecto será o juiz, ponderando as terapias realizadas pelo seu filho, quanto tempo leva cada sessão, se sua jornada de trabalho contratual é integral ou parcial, etc.
Em nossa atuação já conseguimos redução de 50% (máximo permitido pela lei), e em outros casos a redução foi de 30%, 20%.
Por isso é de grande importância que o relatório médico e dos profissionais que acompanham o paciente sejam detalhados.
Se a minha jornada de trabalho for reduzida eu terei redução no salário?
Não. Essa redução de jornada é determinada sem que tenha redução proporcional do salário, ou seja, você continuará recebendo o mesmo salário apesar de trabalhar menos.
Se a minha jornada de trabalho for reduzida eu terei que fazer compensação de horas?
Não. Essa redução de jornada é determinada sem que seja necessário a compensação de horas, ou seja, você trabalhará menos, continuará recebendo o mesmo salário, e não terá esse tempo colocado em banco de horas.
Terei minha jornada de trabalho reduzida por quanto tempo?
Você terá direito a redução da jornada de trabalho, sem redução salarial ou compensação de horas, enquanto perdurar as necessidades do seu filho e/ou dependente.
Posso ser prejudicado no trabalho por ter ingressado com ação judicial?
Não. O acesso à justiça é um direito de todos, garantido pela Constituição. Eventual processo judicial pleiteando a redução da sua jornada de trabalho não poderá afetar a sua carreira.
Quando tempo a Justiça demora para analisar um pedido de redução de jornada?
Pode ser rápido, pois este tipo de ação judicial é elaborado com pedido de liminar, o que significa dizer que em poucos dias a Justiça pode determinar que o seu órgão de lotação/empresa em que trabalhe, reduza de imediato a sua jornada de trabalho, sem prejuízo do salário ou necessidade de compensar as horas.
Para que um juiz dê a ordem em caráter liminar é preciso que fique demonstrado que o empregado/servidor público tem direito e que a situação é urgente, de forma a permitir que a Justiça antecipe este direito para o começo do processo.
Em regra, um processo judicial dura muitos anos, e a liminar pode permitir a sua redução da jornada de trabalho logo no começo da ação, ou seja, não significa que com a liminar o processo estará encerrado, mas é possível que a liminar permita desde logo que você usufrua desse direito.